Qual é o protagonista das histórias que você lê? Uma garota ou um garoto? Um homem ou uma mulher? Animais antropomorfizados? Seres mitológicos? Heróis? Uma árvore?
Com certeza você já leu diversos contos e narrativas com os mais diversos “tipos” de personagens centrais. Mas aí eu te pergunto: já leu a história de um pneu?
“Ora, mas quem escreveria isso? E POR QUE escreveriam isso?“
Aí eu que te pergunto: por que NÃO escrevê-lo?
Todo mundo tem uma história para contar, mas nem todos possuem alguém para escutá-la. Um mero e redondo pedaço de borracha como eu dificilmente atrairia os olhos de alguma pessoa. Poucos, pouquíssimos mesmos, gostam e notam a gente.
Quando expostos num mercado, a maioria dos que estão ali apenas verbalizam um “Nossa, que cheiro forte de borracha nova!” ao passarem por uma pilha de nós. Ou na rua, quando um carro derrapa, esbravejam “Que fedor de borracha queimada!”. Mas olhar para nós e admirar, raros.
Não lembro exatamente quando fui fabricado, muito menos devo ter um nome. Se tenho, nunca me falaram. Só me recordo que, quando dei por mim, havia alguns números gravados em minha superfície que alguns diziam ser número da série ou lote, algo assim.
Havia um nome também, mas pouco me importava, pois todos os outros pneus ao meu redor possuíam o mesmo (talvez o único pneu com nome seria o Bibendum, se é que posso considerá-lo como “apenas um pneu”). Me falaram que é uma tal de “marca”.
Um dia, juntamente com três parceiros, fui colocado num carro. Nada muito ostentador. Era um carrinho compacto bem simples que com certeza a juventude não desejava como sonho de consumo.
Fomos parar nas mãos de um senhor bem simpático, Francisco Garcia. Devia ter uns 60 anos. Cuidava da gente com todo carinho. Ele já não trabalhava, vivia da mesada do filho mais velho. Maior parte da semana ficávamos passeando por aí.
Viajávamos muito! Nem sei dizer quantos quilômetros rodamos.
Sr. Garcia era desses homens que nunca gostou de ficar fechado em casa. Adorava passear e conhecer lugares novos. Nada era tão longe (e caro) suficiente que ele não podia ir. Um dos seus “passatempos” era almoçar em outras cidades, ou até mesmo visitá-las só para ficar sentado em alguma de suas praças para ler jornal. Já para mim e para os outros três pneus, adorávamos também andar por aí, assim como olhar quem estava ao redor.
Tudo era novidade. Pessoas, ruas, construções, cachorros urinando em nós, estradas, e até outros pneus. De vez em quando cruzávamos com algumas bicicletas, e ficávamos pasmos com a finura dos pneus que a levavam. Éramos bem mais robustos perto daquelas magrelas, mas não nego que tinham seu charme. Nem parecia que nascemos quase na mesma época, com uma diferença de uns 40 anos.
Hoje, faz uns 170 anos que nós, pneus de carro, existimos, e ainda encontramos o nome dos pioneiros dessa invenção pelo mundo. Nossa história é meio confusa, cada um diz uma coisa. Mas com certeza você já ouviu falar, pelo menos, dos irmãos Michelin, que foram os primeiros a patentearem o pneu para automóveis em 1845. Ou talvez Charles Goodyear, que criou a borracha vulcanizada em 1839, utilizada para criar nossa primeira geração.
Os pneumáticos daquela charmosa bicicleta foram inventadas em 1888 pelo John Dunlop, na tentativa de evitar quedas de seu filho na bicicleta. Sim, certeza que algum desses nomes você já viu por aí. Se não viu, é porque está precisando sair um pouco mais de casa, meu caro. Garanto que o Sr. Garcia já viu muito. E falando no Sr. Garcia....
Nossa vida era muito boa com o esse senhorzinho, a única preocupação era que ele não entendia tanto da manutenção do carro. Confesso que nem eu nem meus três camaradas também sabíamos. Ninguém aqui foi instruído ao sair da fábrica, simplesmente saímos. Estávamos muito bem, obrigado, naquele carrinho preto, xodó do nosso Chico.
Um dia, contudo, algo havia mudado. Sair por aí começou a ser mais difícil. Não para o Sr. Garcia, mas para nós. Nossa superfície parecia diferente, mais lisa. Parece que nosso desempenho tinha caído.
Não fazíamos a mínima ideia do que podia ser. Não tínhamos feito nada de diferente. Tudo era sempre igual: ajudar o carrinho a sair por aí levando nosso senhor. Este, também não havia mudado nada em relação a nós. O problema veio quando seu filho nos viu.
Lembro perfeitamente que nos olhou, um por um, com uma cara preocupada, voltando para a sala logo em seguida. Não escutamos o que disse ao seu pai, mas minutos depois ambos vieram até nós e ficaram um tempo nos observando.
“Tem um chiclete grudado em mim?”, pensei. Quem dera fosse.
“Estão desgastados. Precisa trocar”.
Não havíamos nos dado conta que isso poderia ocorrer. Muito menos sabíamos que tínhamos “prazo de validade”.
O que ocorre com um pneu depois de tanto tempo?
Ficamos apreensivos, era a primeira vez que passávamos por aquela situação.
Sr. Garcia entregou a chave do carro para seu filho, que saiu conosco. Olhamos para trás, e vimos que nosso Chico já havia entrado na casa e estava deitado no sofá vendo TV. Simples assim.
Bom, para vocês, não preciso explicar detalhadamente o que aconteceu, não? Sim, fomos parar num lugar esquisito e retirados do carrinho preto sem cerimônia alguma.
Não vimos direito o que ocorreu. Lembro de relance apenas que um pneu novinho, em toda sua glória, foi levado até o carro. Provavelmente ocupando nossos lugares.
E quanto a nós? Cá estamos jogados num depósito com outros pneus “velhos”. Não sabemos ainda quando sairemos daqui. Só sei que faz um tempo que virei berço de mosquito.
Se um dia sairemos, é um mistério. Por ora, ficamos largados aqui dividindo nossas histórias.
Alguns já estão tanto tempo que a insanidade os levou. Outros, se mantém esperançosos.
Há boatos de que pode ocorrer uma tal “reciclagem” com alguns de nós em melhor estado. Será que posso virar mesmo uma poltrona? Não sei, muitas coisas do mundo ainda desconheço. Mas não seria nada mal. Imagina se isso ocorresse, e daqui, do meio dessa pilha bagunçada e esquecida, eu fosse reformado e parasse na sala de alguém.
Após uma vida nas estradas, não seria nada mal uma aposentadoria assim, tranquila, na calmaria da sala vendo TV com os familiares. Quem sabe um dia até o próprio Sr. Garcia sossegue um pouco e resolva fazer isso.
Mas creio que são apenas sonhos. Sonhos que mantém a luz da esperança acesa.
No fundo todo mundo deve saber que sua vida acabou faz tempo, mas recusam-se a admitir e se conformar.
Nem tem como se conformar.
Para nós, sobrou apenas o limbo, e nada nos resta além de esperar.....esperar......e esperar.
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