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Café introvertido ~

 

 

Há cinco anos eu redigia aqui um conto de guardanapo. Relendo-o,  parece que foi há muito mais tempo que eu estava sentada naquela cafeteria olhando ao redor e rabiscando o papel à minha frente. 
 
Algumas coisas não mudaram: continuo pedindo meu café numa mesa tranquila enquanto observo as pessoas ao redor. Porém, agora a cafeteria está mais vazia, e os poucos clientes presentes portam uma máscara em seu colo. 
 
Raramente pego um guardanapo para rabiscar, evitando tocar em utensílios públicos na medida do possível. Já faz uns anos que sempre tenho comigo um caderninho na bolsa, dispensando a necessidade de pegar um papel do local para escrever. 
 
Na falta daquele, conto agora com meu smartphone para gravar qualquer ideia que pipoque da mente sem aviso.

As pessoas ao redor continuam concentradas em seus projetos; entre um gole e outro, seus olhos percorrem a tela que carregam, resolvendo questões ou dando risada. 
 
Alguns estão imersos nas páginas de um livro, e a novidade foi encontrar um personal trainer lecionar uma aula ao vivo pelo seu celular, no meio da cafeteria, com direito à demonstração de seus tríceps. Singular. 
 
Inegável que as pessoas continuam valendo minha observação, independente de quantas vezes eu a faça. O jazz que ecoa de meus fones dão uma atmosfera mais cativante a esse cenário. Assisto em silêncio, bebendo meu café e fingindo estar absorta à música e aos meus pensamentos.

Aliás, poder ficar em silêncio, só vivenciando aqueles minutos enquanto desfruto de uma bebida gostosa, tem sido um deleite para minha introversão. Nem me recordo há quanto tempo que não permito que ela se aflore, tomando meu corpo e comandando minhas ações (ou a ausência delas). 
 
Os dias estudando em casa foram a deixa para que ela me visitasse. Com a rotina que eu levava, nem me dava conta de como sentia sua falta. 
 
Acolhê-la novamente trouxe uma serenidade que há muito não sentia. Não creio que ela vá embora; criou raízes mais profundas em minha mente para não ter risco de ser perdida...e eu nem quero perdê-la.

Agora, entre as pessoas e o café, estamos cá eu e ela. 
 
Nas entrelinhas do silêncio, sua voz soa mais alto.  
 
Vou riscando meu papel enquanto ela observa e me assessoria. 
 
Talvez fosse a companhia que me faltava para eu voltar a escrever minhas ideias.

~ VK ~




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